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segunda-feira, 18 de março de 2013

Jogos do amor capítulos 81 à 85





81

No sábado à tarde, parecia que a casa inteira estava espremida em apenas um quarto. Sophia já tinha permissão para subir e descer as escadas duas vezes ao dia, mas como todas as coisas que ela pudesse precisar estavam ao redor de sua cama, passou a maior parte do tempo dentro do quarto.


- Por que a gente também não leva o microondas e a torradeira para lá? - disse para o meu pai.
- Bem, gatinha, é uma idéia. Talvez o microondas.
Coloquei a mão na testa e saí andando.
E agora eu estava contribuindo para a bagunça, após ter tirado do armário quatro shorts, três tops, vários pares de sapato, caixas com brincos e faixas de cabelos. Fiquei em frente ao espelho e estiquei o meu cabelo para cima, depois para baixo.
- O que você está escolhendo? - Sophia falou como se não soubesse, mesmo depois de ter me perguntado duas vezes quando é que Arthur chegaria.
Mas eu respondi tranqüilamente. Estava decidida a mudar de comportamento.
- Que roupa vestir. E não sei se faço uma trança no cabelo.
- Em outras palavras - ela observou -, se dá ou não em cima dele?
- Não foi o que eu falei, Sophia.
- Você teria coragem? - ela perguntou.
Comecei a escovar o cabelo.
- Teria coragem de se arriscar mais uma vez?
Comecei a escovar com mais força.
- Por que você não dá o troco na Pérola?- persistiu.
- Quantas vezes eu vou ter de te explicar? - retruquei. – O Arthur me pediu ajuda para conquistá-la. É esse o propósito do encontro de hoje.
- Tudo bem, tudo bem. É só uma saidinha.
Passei a escovar furiosamente o cabelo.
- Lua, pare! - ela gritou, segurando a minha mão. – Desse jeito, vai acabar ficando careca!
Sentei na cama, com o meu couro cabeludo formigando, e olhei para as minhas opções de roupa.
- Calma, vou te dar uma ajudinha - disse Sophia. – Eu arrumo o seu cabelo e escolho as suas roupas.
- Sophia, não...
- Ah, vamos... vai ser legal.
Sophia não quis ouvir o meu protesto e se aproximou de mim rindo.
- Seja uma boa menina e deixe eu fazer alguma coisa. Vai ser como quando éramos crianças e brincávamos de salão de beleza!
- Não, quem sabe outro dia... - disse, então vi a expressão em seu rosto. Aquele tédio costumeiro havia desaparecido por completo. - Está bem, madame Esmeralda! - Era este o nome que ela sempre escolhia.
Naquela tarde, madame Esmeralda se superou.
- Casual, mas elegante - ela disse. E prendeu o meu cabelo com um nó frouxo no alto da cabeça, de modo que fiquei parecendo uma daquelas mulheres românticas em algum anúncio de revista de 1910.
Então, escolheu uns brincos simples de pingente e me emprestou uma blusa que ela ainda nem havia usado. Era justa e fiquei com um visual bem legal, totalmente diferente das camisetas largas que costumava usar. Sophia insistiu para que eu vestisse uma minissaia; depois de muito tempo aceitei colocar um short que eram mais alinhados do que os habituais shorts esportivos. Ela começou a me maquiar e, quando terminou, ainda que eu estivesse vestida para um jogo de beisebol, parecia pronta para um baile de formatura.
Descemos. Meu pai passou por mim, então, virou o pescoço para me olhar:
- Nossa, você está linda, gat...
- Não me chame de gatinha!
Passaram-se anos até que eu arranjasse coragem, mas finalmente eu havia dito. Por um momento, meu pai pareceu ter sido surpreendido, depois sacudiu a cabeça e escapou para a cozinha.
- Ela está menstruada? - escutei ele perguntar para minha mãe.
Então a campainha tocou. Meus pais saíram rapidamente da cozinha para as formalidades. Sophia estava inacreditavelmente simpática, respondendo a cada uma das perguntas de Arthur. Por fim, saímos.
- Vamos jantar em algum dos bares perto do parque – disse Arthur - e, depois, vamos andando para o estádio.
- Acho que vamos assistir a um grande jogo. Randy Johnson dos Orioles tem um lançamento... - comecei a tagarelar, usando todo o meu vocabulário de beisebol. Não fechei a boca durante todo o trajeto até a cidade, com medo de que ficássemos em silêncio por muito tempo ou, o que seria pior, que começássemos a conversar sobre Pérola. Vinte e cinco minutos depois, quando já havia esgotado todas as minhas histórias fascinantes sobre beisebol, Arthur entrou em um estacionamento no centro da cidade.
- O que é que está diferente em você hoje? - ele perguntou, logo que entramos no elevador do estacionamento.
Dei uma olhada na minha roupa.
- Sophia estava entediada. E resolveu escolher minhas roupas. Penteou, maquiou, fez tudo.
- Como vocês estão indo?
- Melhor - de repente, o chão do elevador tremeu. Havíamos chegado no térreo. Fui saindo, quando Arthur agarrou o meu braço.
- É... hã... bom ter os meus pais por perto e não ser a responsável pela casa.
- Você está bonita - ele me falou.
"Bonita.”






82

- Você está bonita - ele me falou.
"Bonita.”
Bem, bonita queria dizer bonita. Não vou mentir que esperava "algo mais", afinal estava bem mais produzida do que de costume. Mas a questão era como um cara que vinha saindo com a Pérola poderia me chamar de algo mais que "bonita".
- Obrigada - disse. - Você também está bonito. - Arthur soltou uma de suas gargalhadas.
Fomos jantar no Balls, que estava apinhado de gente comendo, conversando e rindo com um dos olhos fixos no jogo de futebol transmitido pela ESPN. Era mil vezes melhor do que o Rita's Health Bar.
Estudei o cardápio, mudando o meu pedido diversas vezes, então levantei os olhos para Arthur.
- O que é que você está olhando? - perguntei.
- A mesma coisa que o carinha lá na frente está olhando.
Virei a cabeça e encontrei os olhos do rapaz. Ele lançou um sorrisinho de paquera para mim e, depois, começou a conversar com os seus amigos.
Corei. Arthur deu uma gargalhada maliciosa, esticou o braço e, naturalmente, acariciou a minha mão.
- Você deveria estar fazendo isso? - perguntei.
- Fazendo o quê?
Por um momento, eu me senti uma idiota. Provavelmente, aquilo tinha sido acidental. Mas, então, sua mão acariciou a minha de novo.
- Isto.
- Eu achei que devia praticar um pouco. Até porque, na última vez que tivemos um encontro...
- Aquilo não foi um encontro - eu o corrigi. - Foi apenas um grupo de pessoas se divertindo juntas.
- Certo - disse com um sorriso bobo. - De qualquer modo, você me deu vários conselhos naquela noite. Deve ser porque eu sou um amador. Bem, essa é a minha chance de praticar com uma profissional, então, eu estou praticando. Tudo bem?
- Claro. Tudo bem. Estou pronta para pedir - respondi, acenando para a garçonete.
Eu não diria que estava "tudo bem". Na verdade, toda vez que Arthur começava a praticar suas lições de paquera, eu acenava para a garçonete. Depois de várias rodadas de salgadinhos e refrigerantes, a mulher deve ter pensado que era eu quem iria pagar tudo aquilo e a conta foi colocada do meu lado da mesa.
Arthur esticou o braço e tirou o papel da minha mão.
- Eu pago. Dormi primeiro - lembrei, pegando a conta de volta.
- Eu sei, mas eu te devo uma - disse, colocando a mão sobre a minha. - Você tem me ajudado muito com a Pérola.
- E você tem me ajudado muito com o Luke.
Ficamos nos olhando por um instante, então, dividimos a conta e saímos.
- Você tem certeza de que não quer que eu explique nada ao Luke sobre hoje? - perguntou, enquanto esperávamos para poder atravessar a rua.
Arthur olhava atentamente para o meu rosto. Fiquei me perguntando se ele suspeitava que já não existia mais nada entre mim e Luke.
- Obrigada, mas eu resolvo isso. Olha, fechou! - falei, e fui a primeira a atravessar a rua.
Eu adoro toda aquela confusão que se forma do lado de fora dos estádios em dia de jogo: as pessoas gritando, os vendedores de amendoim, de pipoca, as barracas com bandeiras e camisetas. E amo comer cachorro-quente, sentindo o cheiro daquele molho apimentado. Arthur agarrou a minha mão, tão logo acelerei o passo. Eu praticamente o arrastei pelas escadas.
Não há nada como subir as escadas, ouvindo a multidão barulhenta a sua volta, e finalmente emergir no alto do estádio com a visão daquele campo verde e brilhante abaixo de você. Cheguei a ficar sem fôlego.
- Quando eu era criança - contei ao Arthur -, eu sonhava em ser duas coisas: uma princesa e um lançador do Oriole.
- Com o que você sonha agora? - perguntou.
Desviei o olhar e sentei na cadeira.
- Com nada. Nada demais - eu não me permitia mais ficar sonhando, fosse com rapazes, ou com a faculdade. Para que correr o risco de me desapontar?
Arthur colocou o braço ao redor do meu ombro.
- Praticando de novo - eu disse.
- Não - retrucou. - Apenas sendo um amigo.
Ele me deu uma palmadinha, então tirou o braço e começou a olhar para o gigantesco marcador de pontos da Liga de Beisebol.
Ficamos de pé durante o hino nacional, Arthur cantava e eu grunhia, tentando me lembrar da letra. Depois, voltamos aos nossos assentos para assistir a um fantástico duelo de lançamentos. Foi o máximo ficar ali com ele, comendo amendoim e assistindo ao jogo. Conversamos sobre beisebol e sobre as crianças. Falamos um pouco sobre Sophia, sobre uns desenhos que Arthur estava fazendo em sua casa e sobre a sua escola na Pensilvânia. Parecia que éramos amigos havia muito tempo.
O jogo continuava e, algum tempo depois, foi dado o intervalo. Levantamos das cadeiras para esticar o corpo quando Arthur virou para mim e perguntou:
- Qual o melhor lugar para dar um beijo numa garota?
Eu pisquei.
- Você quer dizer... sem ser na boca?
Arthur soltou uma gargalhada.
- Não, eu queria saber qual é o melhor lugar, o mais romântico: no alto de um monte, perto do mar, dentro do carro...
-Ah!
- Mas deixa pra lá. A sua pergunta é mais interessante – ele disse com os olhos brilhando de curiosidade. - Diga. Onde?
- No pescoço.
- Por quê?
Uma mulher bem gorda vestindo uma calça laranja e a camisa dos Oriole virou a cabeça e olhou para nós. Acho que ela também queria saber por quê.
- Sei lá. Eu acho que um beijo na testa significa que você é uma criança. Beijo na bochecha é para parentes e políticos. Um beijo na mão pode ser charmoso, mas é antiquado e formal demais. Já no pescoço... é outra coisa, talvez porque o pescoço seja um lugar muito vulnerável.







83

Ele fitou o meu pescoço e, num gesto automático, coloquei a mão direita sobre a garganta.
- Certo - ele disse. - E o lugar? Qual o lugar mais romântico?
- A Pérola diria que é qualquer lugar perto da água. A piscina da casa dela, um porto, até mesmo uma fonte.
- E o que você diria?
Peguei a lata de refrigerante que estava debaixo da minha cadeira, voltei a ficar de pé e bebi um longo gole com o canudinho.
- Eu não sou a pessoa mais indicada para responder essa pergunta. E, se eu fosse você, não prestaria tanta atenção à minha teoria do pescoço. Eu já não tenho mais tanta certeza sobre as coisas.
- Quer dizer que você já não é mais a guru das paqueras? - ele começou a debochar de mim. - Você não é mais expert em conquistas amorosas?
- Acho que não.
- Quando você chegou a essa conclusão?- perguntou interessado.
- Tarde demais - respondi.
- Senta!- berrou uma torcedora atrás de nós, me deixando feliz por ter que voltar para a minha cadeira.
Nos mantivemos ocupados assistindo ao resto do jogo e, finalmente, os Orioles venceram com uma larga vantagem.
- Bem, foi ótimo – disse a ele, assim que saímos do estádio.
- Só espero que a gente consiga achar o carro agora.
- Eu gostaria de passear até o porto - ele disse.
Eu devo ter demonstrado a minha relutância.
- Vamos lá, Lua. Senão o que nós vamos contar para a Pérola? - perguntou. - Quer dizer, é por isso que estamos aqui, não é?
- Claro - disse.
- E eu não acho que um jogo de beisebol faça parte da lista de encontros inesquecíveis da Pérola.
Eu tinha certeza que não.
- Já um longo passeio, perto do mar, como você disse...
- Está certo. Vamos.
- A Pérola falou alguma coisa com você? Sobre nós dois estarmos aqui hoje? - ele me perguntou enquanto andávamos para o porto.
- Não. Eu não tenho notícias dela desde terça-feira. Acho que ela deve estar furiosa.
E o mais estranho era que eu não estava nem um pouco preocupada com isso. Era um alívio não ver a luz da secretária eletrônica piscando e ouvi-la dizer que precisava muito conversar comigo sobre Arthur, o bailarino Dan ou quem quer que fosse.
Quando eu e Arthur chegamos ao porto, seguimos o caminho de tijolos ao redor do grande aquário da entrada e ficamos um tempo admirando os peixes. Então, circundamos por trás das lojas, dos quiosques e do carrossel colorido. Eu já tinha estado ali diversas vezes, mas hoje tudo parecia diferente. Andamos silenciosamente e paramos na margem do porto, de onde podíamos enxergar o mar e a cidade ao fundo. Os prédios eram grandes retângulos de luz piscando com uma lua enorme pairando sobre eles. Barcos balançavam na água, próximos ao porto, e era possível escutar as vozes distantes das pessoas que conversavam nos quiosques. Uma fila de bóias coloria a boca escura da enseada com luzes vermelhas e verdes.
Permanecemos em silêncio, mas eu fiquei imaginando como Arthur se sentia diante daquela paisagem, se ele a percebia como música ou como formas a serem desenhadas. Senti a presença dele atrás de mim e instintivamente virei meu rosto em sua direção. Ele estava bem perto, quase me tocando. Abaixou o rosto, quase tocou o meu, e sua boca permaneceu a poucos centímetros da minha. Ele mal respirava.
- Está praticando - eu falei.
- Isso. Isso mesmo. Como estou me saindo?
- Acho que está pronto para os campeonatos - retruquei, dando uns passos para o lado. - E eu estou pronta para voltar para casa.
Ele me olhou surpreso.
- Você quer ir embora?
- Ahã.
Arthur me olhou intrigado com as mãos pendendo ao lado do corpo. Então, ele colocou-as no bolso e disse:
- Tudo bem.
Retomamos pelo mesmo caminho e percebi que a cidade não estava piscando tanto quanto eu havia pensado. Uma terrível teoria começou a se formar em minha cabeça. Arthur não era, de fato, um cara legal. Ele não queria apenas a minha ajuda para conquistar Pérola; ele estava fazendo um jogo duplo, um com ela, outro comigo, e aproveitando cada minuto disso. Talvez ele soubesse que eu estava sendo fisgada. Talvez estivesse se esforçando ao máximo para me conquistar, um tipo de vingança por todo aquele tempo em que eu mal olhava para ele. Doía muito pensar nisso.
"Bem, cresça", eu falava para mim mesma. "Também dói muito para Sophia saber que o pai do filho dela não é um cara legal."
O caminho de volta foi longo. A uns dois quarteirões de casa, atravessamos uma estreita avenida cercada de árvores que escureciam o caminho.
Arthur desacelerou o carro, quase parando.
- Eu ainda não havia encontrado as ruas escuras - ele falou.   
- Bem, depois que você me deixar em casa, pode vir aqui dar umas voltinhas - disse, ríspida.







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Ele me deu uma espiada de canto de olho e aumentou a velocidade. Finalmente, chegamos. Saí do carro primeiro, mas ele me alcançou no caminho até a porta.
Durante os dois últimos anos eu vinha reclamando do modo como meus pais deixam as luzes da entrada de casa acesas, sempre que eu tenho um encontro. Toda vez que um cara me dá um beijo de despedida, eu fico esperando um diretor gritar "corta". Mas hoje à noite eu estava agradecida por toda aquela luz.
- Imagino que seus pais querem ter certeza de que você chegará com segurança até a porta - observou Arthur, olhando as lâmpadas dos postes.
- É. E assim é mais fácil para o meu pai ficar me espiando de dentro da casa escura sem ser visto.
Era mentira, mas me deu uma injeção de coragem para terminar o que eu havia começado.
- Boa noite - eu disse alegremente e fiquei nas pontas dos pés para beijá-lo no rosto - bem longe da boca - na verdade, quase no seu ouvido. Então as luzes se apagaram.
Todas elas: as luzes da varanda, dos postes, a luz do portão. Congelei, pega de surpresa, parada muito perto dele no meio da escuridão. Ele me abraçou e me puxou contra o seu corpo. Arthur estava prestes a me beijar. E eu não conseguia pensar em nenhum comentário inteligente para fazê-lo parar. Para falar a verdade, eu nem queria pensar em comentários inteligentes.
Lentamente, ele inclinou a cabeça, mas sua boca não tocou a minha. Percebi que ele havia mudado de idéia. Então senti seus lábios sobre o meu pescoço. Em minha garganta, pude sentir um beijo longo e quente, suave como uma noite de verão.
- A gente se vê, Lua - ele disse e me deixou sozinha ali, diante da porta, tremendo.








 85

Parecia ter sido um terremoto, mas eu acho que foram apenas os meus joelhos que balançaram. Pelo menos, a casa continuava de pé e as folhas da nossa antiga macieira mal haviam se mexido.


Minhas mãos trêmulas não conseguiam girar a chave de casa. Então, descobri que a porta da frente estava destrancada. Virei a cabeça e vi Arthur parado no carro, se assegurando de que eu entraria. Bem, agora ele tinha muitas coisas para contar à Pérola. Ela correria para os seus braços exatamente como ele havia planejado. Exatamente como nós havíamos planejado.
Abri e empurrei a porta.
- Espero ter desligado as luzes na hora certa - disse Sophia.
Ela estava sentada no topo da escada, já de camisola.
Acendi a luz do hall de entrada.
- Perfeito - falei com uma voz monocórdica. Eu havia passado do terremoto para a completa paralisia. Subi os degraus lentamente.
- Você está bem? - perguntou Sophia.
- Claro.
Fui direto para o banheiro antes que ela começasse a fazer muitas perguntas. Lavei o rosto com a porta do armário da pia aberta, de modo que não precisasse ver no espelho a maquiagem perfeita voltar a ser um rosto comum. Tudo o que eu queria era subir na minha cama, puxar os lençóis sobre a cabeça e dormir. Mas, quando entrei no quarto, vi uma forma de brownies e um copo de água esperando por mim sobre a mesa entre as nossas camas.
- Não posso mais descer as escadas hoje, por isso, se você quiser leite, vai ter de ir até a cozinha pegar - falou Sophia, de sua cordilheira de travesseiros.
Eu realmente não estava com fome, mas ela havia se esforçado para fazer aqueles brownies para mim. E só havia um quadrado faltando na forma, o que significava que ela os havia defendido até mesmo de papai.
- Parecem estar deliciosos - falei, tentando mostrar algum entusiasmo enquanto eu os cortava.
- Lua, sinto muito que as coisas não tenham saído como você esperava.
- Eu sabia que acabaria dessa maneira - sacudi os ombros. – Eu sabia onde estava me metendo, mas eu devia uma a ele. Bem... também não era só isso - falei em voz baixa, enquanto cutucava alguns pedaços com a faca. Eu sei que vai parecer maluquice, mas eu quero mesmo que o Arthur seja feliz. Ainda que ser feliz signifique ficar com a Pérola. Então, resolvi ajudá-lo. Doido, não é?
- A insanidade corre na família- disse Sophia, jogando uma perna sobre um lado da cama. - Mas escute, um dia você ainda vai ter uma surpresa. Eu gostaria que Arthur a tivesse surpreendido... mas se não foi ele, vai surgir outro cara. É verdade - ela falou, balançando os pés. - Lua, se tem uma coisa que eu aprendi nas últimas semanas, é que as pessoas sempre nos surpreendem. Elas sempre descobrem pequenas maneiras de estarem lá para você, de te fazer sorrir mesmo depois que você já havia decidido que não iria sorrir de novo. E isso te toca - ela disse, fitando a prateleira onde estavam os ursinhos de Chay e os cartões das crianças.
Eu mastigava pensativa.    
- Vão aparecer outros - ela repetiu. - Confie em mim.
Eu não iria me comprometer.
- Você não quer nem um brownie?
- Já comi. Papai e eu dividimos um pedaço.
- É, mas você está comendo por dois, Sophia. E também deveria pensar mais seriamente se quer que o Camarada seja um chocólatra. Não sei quanto a você, mas eu já estou contando com isso. Já fiz até planos: toda Páscoa, eu vou fazer com que papai e mamãe comprem uns coelhos de chocolate enormes, que o Camarada irá dividir alegremente com a tia Lua. E, quando o Camarada já estiver andando, irá sair fantasiado no dia das bruxas pedindo doces. Cada mão segurando uma sacola, uma para ele, outra pra tia Lua. Depois, no Natal... bem, digamos apenas que eu tenho grandes planos pra esse garoto.
Sophia soltou uma gargalhada e cortou um pedaço de brownie para cada uma. Comemos em silêncio, mas num silêncio confortável. E ela ainda estava sorrindo um pouco. Logo depois, apagamos as luzes.
Mas a dor não havia sumido. Quando fechei os olhos, imaginei Pérola deitada ao lado da piscina falando com Arthur pelo telefone, enquanto ele corria pelo quarto, colocando a sunga e a toalha na mochila. Seja lá como for, a dor estava ainda mais profunda.
Mas as pequenas surpresas também estavam lá. Os brownies. Sophia sorrindo.
No dia seguinte, eu iria encontrar maneiras de me manter ocupada. Talvez pintasse a antiga escrivaninha que seria do Camarada. E aí chegaria a segunda-feira, com um ônibus repleto de crianças agitadas cheias de surpresas. Isso me faria bem.
- É difícil entender por que a tia Madeleine resolveu pintar uma escrivaninha de roxo metálico - disse, dando uma olhada nos meus braços. A tinta lixada tinha se misturado com suor e minha pele estava ficando violeta brilhante. - Ela não foi pro convento uma vez?
- Deve ser esse o motivo do roxo metálico - retrucou Sophia. Ela se reclinou em uma espreguiçadeira a uns três metros de onde eu estava trabalhando no quintal. Sobre o seu colo estava um dos livros de antropologia que eu enfiara em sua pilha de revistas. Ela apenas o folheava, dando uma espiada nas figuras,mas já era um começo.
Pode parecer estranho, mas eu estava feliz de ter a companhia de Sophia enquanto raspava a tinta da escrivaninha. O sol do domingo à tarde queimava em um círculo amarelo ao redor de nossa árvore. Recuei um pouco, enxugando o suor da minha testa, para admirar a superfície ultralisa da escrivaninha.
- Oi, Pérola - disse Sophia.

Continua.....

Coisas mais lindas da minha vida queria  dizer que essa web  esta perto de acabar (acaba no capitulo 95) e qui não vai ter 2º temporadan, porque eu nao estou tendo tempo para escrever mais bjs

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