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quarta-feira, 13 de março de 2013

Jogos do amor capítulos 70 à 75





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- Como está a Pérola?- perguntei.
- Pérola?
- Sua namorada – disse Miguel.    
Arthur deu uma piscada.
- Ah, certo. Sentimos sua falta durante o almoço. - "Com certeza", eu pensei e olhei para o céu. A chuva chegaria tarde demais.
- Acho que você já deve saber que saí com ela no fim de semana - continuou Arthur.
"E saiu, e saiu de novo e saiu mais uma vez", eu pensei.
- Ahã. A mãe dela me contou - disse. Começamos a andar juntos para o centro acadêmico. - Isso é ótimo. Realmente ótimo.
- Como foi o seu final de semana? - perguntou Arthur.
- Ah, foi ótimo também.
- Ela comeu um monte de brownies - entregou Miguel. Arthur riu:
- Ovos Mexidos gosta de brownies?
- Não, eu gosto - respondi secamente.
Arthur inclinou-se um pouco para a frente, como se tentasse ler o meu rosto. Tentou fazer com que eu o olhasse de volta, tentou fazer que nossos olhares se cruzassem.
- Se a gente não se apressar- falei -, vamos ficar encharcados.
"Por favor, chova, por favor, comece a chover agora." Alguém devia estar me escutando. Um relâmpago tomou o céu. Agarrei a mão de Miguel. Ele gritava como um porquinho, e nós corremos para o centro acadêmico. Miguel e eu não paramos até chegarmos perto das crianças que saíam da lanchonete. Eugene puxou o meu cabelo molhado. Janet quis saber por onde eu tinha andado. Estava feliz por estar entre as crianças, que não paravam de rir e conversar. E, além disso, eu me sentia aliviada por elas estarem aglomeradas ao meu redor, protegendo-me dos olhares questionadores de Arthur.
À noite ainda continuava chovendo. Era possível ouvir as gotas no telhado e o barulho de uma velha calha solta que não parava de sacudir. Sophia e eu estávamos sentadas no sofá assistindo a um dos seriados de TV mais idiotas que eu já vi. "É assim que vamos terminar", pensei, "Sophia e eu, duas irmãs solteiras vivendo juntas, assistindo a seriados estúpidos, cuidando do Camarada."
- Devo assar uns brownies?- perguntou Sophia.






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- Devo assar uns brownies?- perguntou Sophia.
- Não - acho que eu tinha voltado a suspirar.
- E aí, o que é que o Luke disse quando você falou que estaria ocupada no sábado à noite? - Sophia quis saber.
Ele havia ligado logo após o jantar, e ela ouvira a conversa até o momento em que eu peguei o telefone sem fio e entrei dentro do guarda-roupa. Mas eu fiz aquilo apenas para irritá-la. No fundo, não ligava se ela soubesse alguma coisa sobre Luke.
- Ele perguntou sobre o domingo.
- E você falou? - disse, querendo que eu continuasse.
- Que estava ocupada.
- E ele?
Apanhei o controle remoto e comecei a trocar de canal.
- "Que tal segunda-feira?". Mas ele precisa dormir cedo, lá pelas dez horas.
- Sabe, Luke não deve ser esperto o suficiente para entender uma indireta - minha irmã disse, colocando a mão sobre a minha.
- Não diga! - falei, "zapeando" ainda mais rápido. - Bem... eu acabei falando que não estava a fim de sair com ele.
- Ele ficou destruído?
- Perguntou se eu gostaria de vê-lo numa competição que está para acontecer.
Ela chegou a se engasgar e tive de rir um pouco.
- Ah, Carl - disse ela.
- Ah, Joe. - Nós não usávamos esses apelidos há muito tempo.
- E você contou ao Arthur que você e o Belo Adormecido não estão mais juntos?
- Por que eu deveria contar isso ao Arthur? - perguntei, ácida. Estávamos de volta ao seriado estúpido. Olhava furiosa para os atores. - Pensei que estivesse acompanhando tudo o que está acontecendo, Sophia. Já deveria saber que ele está saindo com a Pérola.
- Eu sei.Mas isso nunca foi um motivo para ela parar, não é?
Levantei do sofá. Talvez eu realmente precisasse de chocolate.
- Não, porque o cara sempre estava interessado nela. Mas Arthur não está interessado em mim - minha voz tremeu. – Sorte da Pérola.
Sophia se levantou para me seguir, então afundou o corpo de novo no sofá.
- Tá tudo bem? - perguntei.
- Tá, com certeza - ela me dispensou com a mão.
Ela não estava com uma cor boa desde que eu voltara para casa.
- Você está com uma cara estranha. O que há de errado?
- Como vou saber? - ela balançou os ombros. - Eu não controlo mais o meu corpo. Parece que ele está possuído.
Franzi as sobrancelhas e abracei o meu corpo. Sentia como se o meu coração estivesse possuído. "Primeiro, alguém rouba o seu coração", eu pensei, "então tudo começa a escorregar de suas mãos."
- Quer alguma coisa da cozinha?
- O que você for comer está bom para mim - ela respondeu.
Eu voltei com um pacote de biscoito e leite. O rosto de Sophia estava com uns dois por cento de sua cor habitual.
- Vamos ver um vídeo - sugeri.
Abri a porta de vidro do armário.
- O que você quer ver? - Eu sei, minha disposição estava incrível. Eu estava realmente preocupada com ela.
- Nosso amor de ontem.
- O quê? - Esse filme fazia parte da coleção dos meus pais e era um melodrama horrível. - Por quê?
- Assim a gente pode chorar e sentir pena de outra pessoa - Sophia sugeriu.
- Mas eu odeio esse filme. Odeio a personagem da Barbara Streisand. Ela tem um cabelo seco, é incrivelmente teimosa. E se apaixona perdidamente pelo cara errado.
- É, bem... - minha irmã deu de ombros.
Fiquei surpresa que ela tenha se segurado para não fazer um comentário maldoso do tipo: "Olhe-se no espelho, Lua". Devia estar se sentindo muito mal.
Coloquei a fita no videocassete e fui pegar os lenços de papel.
Já estávamos na metade do filme, quando Sophia se curvou para a frente e apertou o botão para desligar o vídeo.
- Acho que preciso dar uma ida ao banheiro.
Ela ficou em pé, imóvel por um instante.
- Sophia?
- Estou bem.
Quando olhei para a parte de trás do vestido dela, um arrepio gelado tomou conta do meu corpo. Havia uma grande mancha vermelha nele. Sophia virou o pescoço para ver o que era.
- Ai - disse e sentou de volta no sofá -, o que a gente faz agora? - Parecia que ela estava prestes a desmaiar.
- Ligamos pro corpo de bombeiros?
Ela franziu a testa.
- Brincadeira - murmurei e corri para o telefone.







72

- Eu não estou cansada - insisti para o Chay durante o almoço no dia seguinte. - Dormi um pouco no hospital - acrescentei. - Não me faça voltar para casa. Eu e Sophia ficamos vinte horas juntas. Isso é praticamente o máximo que conseguimos suportar.


O médico havia liberado Sophia às nove horas da manhã, recomendando repouso absoluto. Às dez, começamos a nos irritar uma com a outra. Às onze, Sophia teria dito "gostaria que você fosse trabalhar". Brigamos por causa disso, e eu telefonei para a nossa vizinha de doze anos. Mandy ficou feliz de ganhar uns trocados para ir lá em casa, ficar esquentando sopa e olhando Sophia.
- Você ligou para os seus pais? - Chay me perguntava agora, encostando-se em sua cadeira no escritório.
- Sophia não iria deixar. Eu não sabia o que fazer, Chay. Ela ficou triste, começou a chorar e me implorou para não ligar pra eles. Eu não queria piorar as coisas. Quer dizer, sei que foi culpa minha. Eu fiz com que ela se sentisse como um grande problema. É tudo culpa minha.
- Não é culpa de ninguém, Lua. E você não pode exigir que Sophia seja racional num momento desses. É você que precisa manter a cabeça no lugar. O que o médico disse?
- Pra manter ela na cama. E ligar imediatamente se ela começasse a sangrar de novo. Amanhã ela vai voltar lá.
- Consegue segurar essa barra?
Fiz que sim com a cabeça.
- Bom - disse Chay, e escreveu algo num pedaço de papel -, aqui está o meu telefone. Pode me ligar a qualquer hora, por qualquer motivo, mesmo que você só queira mais uma pessoa por perto. Se você me ligar às três da manhã, já estarei a caminho de sua casa um minuto depois. Levando uma pizza.
Sorri um pouco, olhei o número, então coloquei o papel no meu bolso.
- Obrigada, Chay.
- E não se preocupe com a noitada do acampamento na quinta. Eu arranjo uma substituição - disse ele. - Para onde eu devo mandar o Hau e as crianças hoje à tarde? – Ainda estava chovendo e o campo estava encharcado. - Para o antigo ginásio?
Concordei, feliz porque teria a ajuda de Hau durante o turno.
Hau chegou ao ginásio carregando um bolo de cartões feitos por suas crianças. Abri cada um deles. "Espero que fique melhor", eu li.
- Obrigada, Tam. Obrigada a todos. Minha irmã vai adorar esses cartões - ainda que Sophia enfiasse todos eles na prateleira mais alta junto dos ursos de Chay, os cartões desenhados já haviam melhorado o meu humor.
Mais tarde, quando Chay trouxe o grupo da segunda série, eles vieram marchando como anjinhos.
- Só para mostrar - sussurrou Chay - que, quando querem, conseguem se comportar.
Nenhum deles implicou com Miguel naquele dia. Não sei se foi o bom comportamento das outras crianças ou o treino do dia anterior que havia aumentado sua confiança, mas Miguel parecia mais feliz e fez duas cestas, o que é bastante para alguém da altura dele. Trabalhar com as crianças do acampamento realmente me ajudou naquela tarde. Fiquei triste quando Chay voltou para levá-las para o ônibus.
De qualquer modo, Chay estava tornando as coisas mais fáceis para mim, bancando o anjo da guarda. E eu ainda não tinha precisado encarar Arthur. Ele já havia me visto com raiva antes; certamente, acreditava que eu era capaz de dizer coisas mesquinhas para Sophia e deixá-la deprimida. Ele me lançaria aquele olhar de investigação; talvez percebesse quanto eu estava temerosa por ela e pelo Camarada. E eu não conseguiria suportar isso; não conseguiria lidar com alguém que me deixasse ainda mais vulnerável.
Eu me sentei na fileira mais baixa da arquibancada e comecei a desatar uns nós antigos no cordão da sacola da bola de basquete. Gosto de ginásios silenciosos. Consigo rezar melhor em velhos ginásios acinzentados de escola do que em igrejas. Curvei o tronco sobre a sacola da bola, segurando os nós da mesma maneira que minha avó costumava segurar as contas do rosário, e comecei a rezar por Sophia. E por mim também.
- Lua? Você tá bem?
A voz de Pérola me assustou.






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- Lua? Você tá bem?
A voz de Pérola me assustou.
- Claro, claro. Só estou organizando as coisas.
Ela cruzou a quadra, vindo em minha direção.
- Como está a Sophia?
- Bem. Vai voltar ao médico amanhã. Ela tá um pouquinho balançada, mas acho que vai ficar bem.
- E você? - perguntou Pérola, sentando-se ao meu lado.
- Um pouco como a Sophia, eu acho.
- Sinto muito. Deve ser difícil para você, né? Eu me lembro quando a minha mãe sofreu aquele acidente de carro. Às vezes, é mais apavorante ser a pessoa que está tentando ajudar do que a que precisa de ajuda.
Engoli seco.
- Tentei te ligar ontem à noite. Eu estava muito preocupada - ela disse. Seus grandes olhos escuros mostravam isso.
- Eu sei. Peguei as suas mensagens hoje de manhã.
- Liguei pro Arthur. Ele também ficou preocupado.
Eu me ergui para recolher as bolas de basquete. Pérola andou para o canto oposto, para pegar uma bola desgarrada, então fingiu que estava fazendo uma cesta. Deu um de seus saltos de ballet, alcançando uma altura incrível para a sua estatura.
- Já te disse, o esporte teve uma grande perda quando você resolveu se dedicar à dança - falei.
- Eu estou amando - ela sorriu para mim. - Eu estou amando o que estou aprendendo aqui. E devo isso a você, Lua. Por não ter me deixado desistir.
- Você é muito boa para desistir - sorri de volta.
- Estava falando sobre isso, ontem à noite - ela disse -, sobre como você me empurrou para fora daquela loja e me deu um sermão. Eu contei pro Arthur.
Desejei que ela parasse de mencionar o nome dele. Na primeira mensagem que Pérola me deixou, antes de falar que estava muito preocupada comigo, ela havia dito que queria conversar sobre o Arthur.
- Preciso de mais alguns conselhos - ela falou.
Enfiei duas bolas na sacola e, então, estiquei minha mão para pegar aquela com a qual ela brincava.
- É sobre o Arthur - acrescentou Pérola.
- E ele?
- Eu realmente gosto dele, Lua - ela enrolava os seus longos cabelos castanhos ao redor dos dedos. - Quero dizer, de verdade.
Sacudi a cabeça, concordando.
- Mas ele não pára de querer me ver, e me ver de novo. É tão estranho... - ela disse.
De fato, essa era uma típica reação masculina a Pérola. A parte mais estranha disso tudo era que Pérola continuava querendo se encontrar com ele. Eu tinha achado o Arthur convencido quando ele me dissera que não precisaria da minha ajuda para ter um encontro, mas percebi que ele estava acostumado a conseguir as garotas que queria.
- Não sei o que fazer - suspirou Pérola.
Tive uma vontade inesperada de levantar a sacola das bolas acima da minha cabeça, começar a girá-la pelo cordão e, então, soltá-la no ar.
- Que tal aproveitar? - sugeri baixinho.
- Eu gostaria de poder - ela me contou. - Se, ao menos, eu não estivesse tendo essas aulas com o Dan.
- Dan? Quem é Dan?






    74

- Dan? Quem é Dan?
- Um outro aluno. Ele estuda em Kirbysmith e é um excelente bailarino. A professora diz que nós somos perfeitos juntos. Ele namora firme com a mesma garota desde o primeiro ano do segundo grau e sempre achou que fossem ficar juntos para o resto da vida. Mas agora que a gente se conheceu, ele não está mais tão certo.
É claro. Um cara com uma namorada. Um aluno de faculdade que está comprometido com a mesma garota desde o segundo grau. Eu tive vontade de berrar e sair correndo por entre os bancos de madeira.
- Você acha que tudo bem se eu sair com o Arthur e o Dan ao mesmo tempo? Eu contaria a eles, é claro. Não os enganaria com falsas expectativas. E mostraria que cada um deles é único para mim.
- Isso seria legal da sua parte - eu disse.
Ela percebeu o tom da minha voz e me olhou rindo.
- Entendi. Você não acha que seria legal.
O que é que eu podia falar? Que eu a achava uma safada por ficar correndo atrás do namorado de outra? Para tirar as mãos do Dan? Se eu dissesse isso, eu a empurraria mais ainda para perto do Arthur. O que, é claro, seria a coisa certa a fazer porque, assim, ela não partiria o coração de outra garota. Pelo menos não da namorada do Dan.
Tentei lhe dizer isso. Para não deixar Arthur escapar. Mas não consegui.
- Não posso ajudar - disse, por fim. – Você precisa se decidir sozinha.
Ela me olhou como se eu a tivesse abandonado.
- Bem, acho que você está com muitas coisas na cabeça agora - falou, tentando ser compreensiva.
- Com certeza - estiquei o braço por entre os bancos, dando um tapinha numa bola de modo que ela rolasse para a beirada da arquibancada. - Talvez a gente possa se falar mais tarde.
- Está bem – concordou disposta, virando-se para sair. - Preciso ir pra casa e me arrumar pra hoje à noite.
"Se arrumar para quem?" Fiquei imaginando por alguns minutos, enquanto retirava a bola debaixo da arquibancada. Eu a peguei e arremessei violentamente contra a parede. Peguei de volta e lancei de novo.
Corri com a bola, quicando-a por toda a quadra, driblando, trocando de mão, correndo em direção à cesta. Lancei. Cesta. Lancei de novo. Cesta. Lancei. Cesta. Não errava uma. Dei um salto: cesta! Agarrei a bola e corri para o meio da quadra, lançando violentamente contra uma pilastra, quer dizer, uma pessoa ao lado da quadra.
- Falta - disse Arthur, agarrando a bola. - Tenho direito a um lançamento.
- Não disse que você podia jogar - peguei a bola de volta.
- Tudo bem, eu só vim para conversar- retrucou.
Exatamente o que eu não queria fazer. Desviei dele e fiz outro lançamento. Cesta. Estava com tudo hoje. Pelo menos no basquete eu estava com tudo.
- Como está a sua irmã? - perguntou ele.
- Bem, está em casa - falei, quicando a bola e a lancei sobre a minha cabeça. Cesta.
- Chay disse que os seus pais estão fora essa semana. E que você teve de levá-la de carro para o hospital.
- Foi ótimo ter uma desculpa para correr no trânsito - retruquei, lançando a bola. Cesta. - Fiquei um pouco desapontada porque ninguém me parou.
- Mesmo?
Na verdade, eu estava tão nervosa na noite passada que não conseguia engatar a marcha certa.
- Você parece estar bem calma com isso tudo.
- Ahã. Não foi nada demais - disse, fazendo mais uma cesta. - Faz parte da gravidez. Sophia também estava tranqüila - menti.
- Bem, se tiver alguma coisa que eu possa fazer por você - ele ofereceu -, qualquer coisa que possa ajudar...
"Vá embora", pensei. "Isso vai ajudar." Errei a cesta.
A bola ricocheteou diretamente em Arthur, e ele não iria desistir dela.
- Posso pegar outra bola na sacola – disse a ele.
- Poderia, mas você é muito orgulhosa para desistir dessa aqui – falou, quicando a bola longe de mim.
Olhei de cara feia para ele.




75

Olhei de cara feia para ele.
- Vinte e um pontos - ele me desafiou. - E como eu sou um cara gentil, deixo você começar.
- Eu não preciso de nenhuma vantagem.
- Está bem - retrucou. - Então, começo eu - ele passou por mim e lançou a bola facilmente. - Dois a zero.
- Sortudo.
Arthur arremessou a bola para mim. Corri, mas ele também foi rápido, e tive que recuar um pouco. Enganei-o com um drible, apenas um movimento pequeno com os ombros. Ele seguiu. Dei a volta pelo outro lado e lancei.
- Dois a dois - gritei.
Ele trouxe a bola para o centro da quadra e eu esperei, sabendo que ele nunca conseguiria acertar a cesta daquela distância. Cesta.
- Quatro a dois - ele olhou para mim.
- Então - falei -, como sua mãe não pôde colocar uma montanha-russa no seu quintal, ela comprou uma cesta de basquete. Toda a sua vida você passou praticando e esperando por este momento, não é?
Ele sorriu e veio andando me trazer a bola. Parou bem perto de mim. Muito perto:
- Toda a minha vida eu esperei por este momento.
Eu dei um drible e saí correndo. Dois passos depois, ele conseguiu me alcançar.
Quanto mais jogávamos, mais ágeis e mais perto um do outro ficávamos. Numa marcação cerrada, os corpos se batiam, os braços suados se encostavam. Eu me mantinha atenta a todos os movimentos dele. Ele já estava me deixando maluca. Parecia estar em todos os lugares para onde eu seguia. Eu ganhava de 12 a 8, mas era como se estivesse perdendo.
Saltamos para disputar uma bola. Demos um encontrão no ar e caímos esparramados no chão, como um polvo, dois corpos esmagados um contra o outro, com oito braços e pernas.
Eu estava por cima dele, atordoada.
- Você está bem? - ele perguntou.
Tentei sair de cima dele, mas Arthur me segurou por um momento. Sem nenhuma segunda intenção. Da mesma maneira que nós seguramos uma criança com a qual esbarramos acidentalmente.
- Estou bem - respondi. – E você?
- Ótimo.
Eu me desvencilhei dele e saí engatinhando para o lado.
- Eu, hã, não quero mais jogar.
- Eu te machuquei - ele disse, sentando-se silenciosamente.
- Não. É só porque eu tive um dia longo. De quarenta e oito horas. Na verdade, o dia de ontem ainda não acabou pra mim.
Ele observou o meu rosto. Ambos estávamos um pouco sem fôlego.
- Você tem mesmo certeza de que não há nada que eu possa fazer? Eu poderia ir até a sua casa e fazer um pouco de companhia pra Sophia, caso você quisesse sair. Quer dizer, você pode querer se encontrar com o Ovos Mexidos - acrescentou.
- Obrigada, mas não. Obrigada. Meus pais vão voltar no sábado.
Ele continuou me observando com aqueles intensos olhos escuros. Seu cabelo escuro estava úmido de suor. Prestei atenção quando ele levantou a camiseta para tirar o suor do rosto. Eu estava querendo tocar o seu cabelo molhado, espiar o seu peito.
- E aí, como vai indo com a Pérola? - perguntei.

Continua..

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